Hom-(em)-bolha

Num certo vislumbre indeciso de mentes estranhas sobrevive uma bolha reluzente de céu. A bolha que enche e seca conforme o acaso das expectações exteriores agora se agita aviltante de pulo em pulo em sapiência de homem. “Com sapiência de homem não se pode brincar pouco”, diz o velho deitado. A bolha se eleva, mais leve que o ar, cintilante a cada empurrão de vento insistente de entendimento e esforço. Bolha ovóide. Atrito. Singela e lentamente passeia pela cabeça do homem. Homem não percebe a bolha. Vive na bolha. Não se escolhe a bolha. Encolhe-se. Posição fetal. Vislumbre transparente. Transparência invisível.

As dúvidas, as falhas, as faltas.


O conhecimento que me ficou perdido.

A certeza que me foi roubada.

A confiança de que me orgulhava.


O desejo que me foi suprimido.

A sensibilidade que me foi negada.

O sussurro que me esperava.


O sentido que nos foi tolhido.

A maturidade que nos foi velada.

O tempo que nos vigiava.


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Decurso

Procurando minha autoconfiança.

Desejando minhas cicatrizes.

Catando meu ego.



Fechado por placas pregadas por fora. Assim me sinto. Contando os dias, detalhando meus passos. Sensação de que me observo em microscópio, aumentado dezenas de vezes. Quantas vezes não reconheço este Souza que desliza num líquido viscoso. SOU, TODAVIA NÃO PODE SER EU.

(Não Verás País Nenhum, de Ignácio de Loyola Brandão)

Souza: ele sempre me socorre nessas horas.

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Decurso
A perceber claramente minhas mudanças.
A procurar as perdidas temperanças.
A não me reconhecer em tais ocasiões.
A tentar, em vão, explicações.


Amnésia onírica.

Enfim, um conforto para a visão. O mundo saindo de suas tocas. A brandura do sopro no cabelo. O arrastar de chinelos na rua. A conversa sem qualquer pretensão dos bares. Os sorrisos involuntários e os remorejos de ouvido. Daí a faculdade se esvai e o desejo de sonho se agiganta. Mas as fantasias não são mais as mesmas e as ilusões não têm mais tanta graça assim. Cessa-se o resguardo dos olhos. As lembranças não vêm. A preocupação. Onde foram parar o sentidos, os diálogos, as fugas? Não se pode mais sonhar. Não se consegue mais.

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Decurso
Feliz, bem feliz, embora tenha perdido algumas lembranças.
Sonhos acordados mais freqüentes, apesar de tudo.
Preocupações iminentes.
Mudanças ainda incalculáveis, mas boas, muito boas, e esperadas há um bom tempo, bom tempo.